Criatividade não dá nota no Enem: por que a ‘cartilha’ da redação exige um texto bem ‘específico’ e ‘limitado’
Apesar dessas características, professor defende que há espaço para o candidato se destacar. Redação integra a primeira parte do exame, que será aplicado nos dias 3 e 10 de novembro. Rascunho da redação do Enem da estudante Caroline Souza, que tirou nota mil, em Goiânia, Goiá, em 2023.
Caroline Souza/Arquivo Pessoal
Mais de 4,3 milhões de candidatos devem participar do primeiro dia de provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) no próximo domingo (3). Uma parte importante do exame é a redação, que pode valer até 1000 pontos e é fundamental para quem busca se destacar na disputa por uma vaga no ensino superior.
Mas para sair na frente nesta etapa, o candidato deve evitar ser muito criativo. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pelo exame, a redação de ter um “tipo textual específico”, com um “rol limitado de características formais”.
“O critério criatividade não é objeto de avaliação do exame, pois não faz parte do construto julgado na prova de redação”, declarou a entidade em nota enviada ao g1 durante a apuração da reportagem sobre os modelos pré-prontos de redações do Enem que são livremente comercializados na internet.
O Enem pede que o participante elabore uma redação dissertativa-argumentativa, de até 30 linhas, a partir do tema proposto no exame. Em 2023, por exemplo, os candidatos escreveram sobre “desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil”.
Redação do Enem ou ‘cover’ de Machado de Assis?
A análise deste texto é feito com base em algumas características obrigatórias, como:
Domínio da modalidade escrita formal da língua portuguesa.
Compreensão da proposta de redação e aplicação conceitos das várias áreas de conhecimento para desenvolver o tema dentro da estrutura dissertativa-argumentativa.
Organização, por meio de fatos, dados e informações, dos argumentos apresentados no texto a partir de um ponto de vista.
Conhecimentos necessários para a construção da argumentação.
Proposta de intervenção para o problema abordado, respeitando os direitos humanos.
Ou seja:
o candidato deve demonstrar conhecimento específico e referências válidas;
argumentar de maneira coesa a partir de um lugar pessoal;
enquanto evita fugir do formato limitado do texto.
E, embora possa parecer difícil se destacar com uma estrutura de texto tão específica, David Gonçalves, professor de redação do Colégio e Curso AZ, diz que não é impossível.
“É possível, a partir das estratégias escolhidas, optar por caminhos mais ou menos convencionais. A escolha por uma comparação inusitada ou uma analogia menos óbvia pode acontecer como parte de intenções argumentativas”, sugere.
Outros elementos, como uma eventual utilização de figuras de linguagem ou de jogos de palavras, além do emprego do repertório sociocultural, ajudam a conferir ao texto certa identidade que não o descaracteriza do modelo pedido.
Não é cobrado que o aluno seja inventivo quanto à expressão escrita, o que dispensa o estudante da necessidade do emprego de estruturar de língua que imprimam estilo. O que se espera de uma análise a respeito da realidade social não é um olhar criativo, mas um olhar que seja capaz de compreender as nuances do que envolve as mazelas.
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